Acabo de ler,
Cartas de um Sedutor, de Hilda Hilst, uma paródia aos romances epistolares dos libertinos franceses do século XVIII. Com este romance, a poetisa brasileira fechou uma trilogia pornográfica que inclui
O Caderno Rosa de Lori Lamby e
Contos de Escárnio/Textos Grotescos.
Se querem um resumo do livro aqui vai: o narrador escreve à irmã a implorar-lhe que venha foder com ele. Ao longo das muitas cartas vamos descobrindo que ela se deitava com o pai e que agora dorme com o filho, que também é seu irmão. O incesto é total. Toda a gente dorme com toda a gente, aliás, homens com homens, mulheres com mulheres, um regabofe.
Mais alucinatório do que malvado, o narrador das
Cartas de um Sedutor, vai assumindo-se, pouco a pouco, como escritor e põe-se a contar histórias. Do arco-da-velha, é claro, porque, como diz,
"o negócio é inventar escorreria, tesudices, xotas na mão, os caras querem ler um troço que os faça esquecer que são mortais e estrume".
Exageradamente obsceno, o romance é incontinente e caótico para além de tudo o que eu possa dizer, mas extremamente bem escrito. Tem imenso humor, claro, e denota uma inteligência extraordinária e uma erudição fora do comum. Pelo meio, tem tiradas destas:
"O que nos resta é a orfandade. Não é que sentimos falta de pai e mãe. Somos órfãos desde sempre. Órfãos d'Aquele".
Deus nunca está muito longe nas obras de Hilda Hilst, seja romance, teatro ou poesia. É para Ele, seu Pai, que ela escreve:
"Sei tudo sobre a crueldade. Conheço Deus". E noutra altura:
"Na natureza tudo come. Do leão à formiga. Até as estrelas se engolem umas às outras. Tenho cagaçal do cosmos. O criador deve ter um enorme intestino. Alguns doutos em ciências descobriram que quanto maior o intestino, mais místico o indivíduo. E quem mais místico do que Deus? Grande Intestino, orai por nós".
Como vou estar todo o Verão imerso na obra fabulosa de Hilda Hilst, não se espantem por isso de a encontrar muitas vezes neste blogue.
Já agora uma precisão: a foto não tem nada a ver, nem com Hlda Hilst, nem com o livro; foi tirada no outro dia no MUDE e mostra duas esculturas de Ana Mena intituladas "A Pega"..