terça-feira, 15 de março de 2011

Don DeLillo


Ponto Ómega, o novo livro de Don DeLillo abre (e fecha) com reflexões suscitadas por uma instalação de Douglas Gordon intitulada 24 Hour Psycho. O escritor viu-a no Moma de Nova Iorque, no Verão de 2006, e descreve-a com minúcia.
Tal como o título indica, a performance consistia em projectar o famoso filme de Alfred Hitchcock em câmara lenta, por forma à projecção durar exactamente 24 horas.
Absolutamente fascinado pela ideia do artista plástico, e pelos pensamentos que ela lhe suscita, DeLillo escreve: «É preciso muita atenção para vermos o que se passa na nossa frente. É preciso trabalho, um esforço dedicado, para vermos aquilo que os nossos olhos vão captando». Uma reflexão que subscrevo inteiramente. Mas a melhor definição do trabalho do fotógrafo, tal como eu o entendo, encontra-se já no final deste romance soberbo, na frase que diz: «Ver a essência do que existe e depois prepararmo-nos para o ver desaparecer.»
Pelo meio, há a história de um cineasta que quer rodar um documentário sobre um velho intelectual que colaborou com o Pentágono. Tudo se passa algures no deserto, entre estes dois homens e uma mulher que desaparece misteriosamente.
O essencial aqui, porém, não é a história, mas assistir a um pensamento em acto. Ver como as palavras, pouco a pouco, se vão convertendo em estados de espírito. Porque, como diz DeLillo, «a verdadeira vida tem lugar quando estamos sozinhos, a meditar, a sentir, perdidos nas nossas memórias, a vasculhar sonhadoramente no nosso inconsciente, os momentos submicroscópios».
Se é bem verdade, que eu leio para me imaginar a escrever, nenhum outro autor me dá esta sensação de, em cada frase, procurar ideias tão radicais e profundas, expostas com palavras incandescentes como carvão em brasa. Adoro DeLillo porque, a meu ver, ele escreve para além dos habituais limites do pensamento, procurando ver e sentir coisas que passam despercebidas aos demais.
Lendo-o, sou mais intensamente aquilo que sou. E, como ele próprio diz, isso é ainda mais estranho do que sonhar.

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