sábado, 20 de agosto de 2011

Raul Ruiz


O médico que o operou disse-lhe que ele tinha um tumor atípico. Ele achou piada, pois ele próprio era atípico, inclassificável.
O cancro levou-o aos 70 anos, antes que pudesse realizar a continuação de «Os Mistérios de Lisboa» (na foto de abertura), a sua obra-prima, que ele temia poder ser o seu testamento. Sobre esse filme, um jornalista da revista Les Inrockuptibles escreveu que é «um folhetim cinematográfico et um filme folhetinesco que reunia todos os sortilégios do cinema ruiziano: narrativas encaixadas umas nas outras,com argumentos retorcidos, personagens bífidas, cenários e figurinos rigorosos, embriaguez ficcional temperada de distanciação e humor, classicismo eivado de modernidade e malícia barroca».
Diz-se que Raul Ruiz, realizador chileno que era também francês, e… um pouco português, realizou quase 120 filmes. Para minha vergonha, só vi o último, mas nunca mais me vou esquecer dele. Até por causa de frases como esta, que não resisto a citar:
«Porque é que o português é tão cinematográfico? Por causa do seu discurso implícito, do que está por detrás da língua, incluindo o silêncio. Quando começamos a falar em francês, sabemos mais ou menos como vai acabar a frase, e o discurso explícito é mais forte do que o resto. Enquanto em português ou em chileno, dizer as coisas frontalmente é considerado obsceno. Daí o encanto indefinível dos actores portugueses quando dizem as suas réplicas: parecem garos a ronronar.»

Le médecin qui l’a opéré lui a dit que sa tumeur était atipique. Ce qui lui a fait sourire, car toute lui aussi était atypique, inclassable.
Il est mort d’un cancer à 70 ans, avant qu’il puisse filmer la suite de «Les Mystères de Lisbonne» (photo en haut), son chef-d’œuvre, qu’il craignait être son testament. Un journaliste du magazine Les Inrocks a décrit le film comme un «feuilleton cinématographique et film feuilletonesque qui recèle tous les sortilèges du cinéma ruizien : récits gigognes, scénarios torsadés, personnages bifides, décors et costumes ouvragés, ivresse fictionnelle tempérée de distanciation et d’humour, classicisme rehaussé de modernité et de malice baroque».
Raul Ruiz, cinéaste chilien qui était aussi français, et un peu portugais, a signé presque 120 films. Malheureusement, je n’ai vu que le dernier, mais je ne vais jamais l’oublier. D’autant plus qu’il était capable de dire des choses comme celle-ci: «Pourquoi le portugais est-il si cinématographique ? En raison de son discours implicite, de ce qui est derrière la langue, y compris le silence. En français, quand on commence à parler, on sait à peu près comment on va finir la phrase, et le discours explicite est plus fort que tout. Tandis qu'en portugais ou en chilien, dire les choses frontalement est carrément obscène. De là le charme indéfinissable des acteurs portugais disant leur texte : on dirait tout le temps des chats en train de ronronner. »

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