domingo, 27 de junho de 2010

Do tempo

Inútil esperar que o futuro se esqueça de nós. O tempo, que tudo apaga, tudo nos faz pagar.

Jean-Luc Godard

De uma entrevista com Jean-Luc Godard:

«Le droit d’auteur, vraiment c’est pas possible. Un auteur n’a aucun droit. Je n’ai aucun droit. Je n’ai que des devoirs».

«L’idée d’accomplir une oeuvre, que la vie vous laisse le temps de l’achever, c’est une question qui vous travaille? Non. L’oeuvre, je n’y crois pas. Il y a des oeuvres, on en produit des nouvelles, mais l’oeuvre dans son ensemble, le grand oeuvre, ça ne m’intéresse pas. Je préfère parler de cheminement. Dans mon parcours, il y a des hauts et des bas, des tentatives… J’ai beaucoup tiré à la ligne. »

«On n’écoute pas la façon dont un arbre philosophe.»

sábado, 26 de junho de 2010

Da insónia


É com toda a razão que se diz «sofro de insónias». A insónia é uma dor. Ou melhor: uma mágoa.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Insónia

São duas, depois três da manhã. Quase quatro e nada. Cada segundo me parece um minuto e cada minuto um quarto de hora. Mais vale anotar alguns pensamentos que me vêm à cabeça:

Enquanto guiava, ontem, veio-me esta ideia à cabeça: Na juventude, o pedal mais importante é o acelerador; na terceira idade, o travão. Mas os velhos que vivem com o travão a fundo gastam-no depressa.

Toda a arte é tosca, imperfeita. Uma obra-prima não passa de um falhanço admirável.

Publicar mais livros para quê? Para não ser compreendido, ou ignorado? Mais vale seguir o conselho de Cioran e limitar-me a anotar pensamentos que possa, eventualmente, murmurar ao ouvido de um bêbado, ou de um moribundo.

Apercebo-me agora (foi preciso esperar pelos 60 anos) que é totalmente estúpido esperar alguma espécie de justiça neste mundo. Não há nada de justo, nem nesta sociedade, nem sequer na Natureza. Até nascer me parece uma injustiça.

Para Cioran (sempre ele), nascer é a primeira e maior desgraça de todas. E ser pai é um crime. Um crime que ele nunca cometeu. Infelizmente, inclino-me a pensar que ele tem razão. Por mim, preferia nunca ter nascido (mesmo se isso é impensável).
Resta-me esperar que os meus filhos me perdoem, caso pensem como eu.

domingo, 20 de junho de 2010

Ainda Saramago

Cesare Pavese viveu toda a vida amargurado por nunca ter conhecido um grande amor. Cioran morreu convencido de que o amor, tal como Deus, não passa de uma ficção. O que mais admiro em Saramago não é a sua obra, mas o facto de ter vivido um grande amor até ao fim. Não é dado a todos.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Pombos



Entrecampos




Nada pessoal


Ontem, tive mais uma agradável surpresa, na sala 14 do Corte Inglês. Nada Pessoal (Nothing Personal), o primeiro filme de Urzula Antoniak deixou-me num estado muito próximo de êxtase. Não porque seja uma obra-prima, mas porque esta cineasta de que nunca tinha ouvido falar (uma polaca radicada na Holanda) conseguiu, com uma simplicidade e um bom gosto que se fazem cada vez mais raros, contar de forma tocante, e num tom que só a ela pertence, a história de um amor improvável entre uma jovem holandesa (Lotte Verbeek) e um velho irlandês (Stephen Rea). O mais admirável, não é a paisagem belíssima (uma boa parte do filme passa-se numa ilha de sonho), nem os actores magníficos, mas sim a contenção formal com que tudo se passa, entre silêncios e imagens que penetraram muito fundo dentro de mim.

In memoriam


«Deus é o silêncio do universo e o ser humano o grito que dá sentido a esse silêncio», escreveu José Saramago, que morreu hoje, aos 87 anos. Desde manhã, os vários canais da televisão portuguesa não se cansam de registar depoimentos de políticos e intelectuais. Tem sido um corropio: não há gato-sapato que não apareça a «botar faladura». Como seria de esperar, de repente, todos o admiram e lamentam, mesmo a canalha do PS e PSD, que ele desprezava. Saramago tinha razão: Deus não existe. Se existisse, os falsos elogios asfixiariam quem os pronuncia.


terça-feira, 15 de junho de 2010

Da crise


É o New York Times quem o diz, na sua edição de ontem: «The easy money is not quite so easy any more».

domingo, 13 de junho de 2010

Noite de Stº António

sábado, 12 de junho de 2010

A nuvem aprisonada

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Pobre Portugal

No meu bairro (Campolide), e presumo que por toda a cidade, os supermercados têm agora, em permanência, um polícia armado à porta. Sabem o que isso quer dizer, não sabem?

Da indústria discográfica


Thom Yorke, líder dos Radiohead, acaba de afirmar : «A indústria da música mainstream vai morrer. Não daqui a uns anos, mas dentro de alguns meses. E não se perderá grande coisa». Segundo a Inrockuptibles, a declaração faz parte de um livro intitulado The Rax Active Citizen Toolkit, que inclui entrevistas com outros músicos, realizadas por um tal Jamie Kelsey.
Dou-lhe toda a razão.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Baixa hoje

Time waits for no one

domingo, 6 de junho de 2010

Dos meus avós



Os meus avós nunca esconderam a aversão que tinham à morte. Tinham uma boa vida e queriam prolongá-la o mais possível (ele morreu aos 95 e ela aos 90).
Poucos meses antes de falecer, o meu avô disse-me: «Só queria ter menos cinco anos». Pensamento admirável que jamais esquecerei. Quanto à minha avó, um dia suspirou: «O que mais me custa é saber que quando me for embora vocês continuam por cá». Na altura ri, sem saber muito bem porquê.
Que queria ela dizer com isso? Fosse o que fosse, o destino pregou-lhe uma partida, pois contrariamente às suas expectativas acabou por morrer primeiro que o marido. O velho rezingão pôde assim sentir na pele a falta que a mulher lhe fazia.

Adorava-os e, na verdade, não os considero mortos; apenas desaparecidos.

Costa da Caparica (ontem)


Foto tirada com uma Canon Ixus 100 IS

Rua da Trindade (anteontem)


Foto tirada da janela da Editora Antígona com uma Canon Ixus 100 IS

sábado, 5 de junho de 2010

In memoriam




Eu estava no ginásio, a correr na passadeira quando, no meio de muitas outras, uma notícia me fez cambalear: «Morreu o escritor João Aguiar». Para desfazer qualquer dúvida que eu ainda pudesse ter, a sua foto apareceu no ecrã da televisão, enquanto o locutor afirmava que ele tinha 66 anos e morrera em consequência de um cancro.
Não era exactamente um amigo, mas trabalhei com ele durante algum tempo e ficámos com uma boa relação. Sempre que me via (a última vez que nos encontrámos fomos numa bomba de gasolina), falava-me muito bem. O João tinha um sorrido bonito, meigo e doce, era sempre um prazer conversar com ele.
Nunca li nenhum dos seus livros. Ele escrevia romances históricos e não é de todo o tipo de literatura que me interessa. Mas estou muito triste com o seu desaparecimento e queria deixar aqui expressa a minha saudade e consternação.
Não me escapou a ironia da situação: eu no ginásio a correr para, durante mais algum tempo, salvar a minha pele e o João, coitado, involuntariamente, veio-me lembrar que é tudo uma questão de tempo, que não há ginástica (nem física nem mental) que nos valha.
No seu «Livro dos mortos» (que continuo a ler, ao ritmo de duas, três páginas por dia), Elias Canetti chega a afirmar que não se devia dizer a palavra morte. Que ela não merece ser nomeada. Que é má demais para lhe darmos confiança. Durante uma boa parte da sua vida, o escritor búlgaro procurou dar-lhe luta, sabendo que era um esforço vão. Ninguém escapa à sua sorte; não vale a pena chamar-lhe azar.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Da paisagem


Todas as paisagens estão de passagem.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Habibiti


Come, dorme e cala-se. Não faz mais nada. A minha gata é um mistério tão absoluto que perante ela me sinto transparente.

Pura realidade

Tinha eu acabado de escrever o seguinte poeminha:
Um pato e uma pata
Mais os seus patinhos
Escrevem no lago
Como eu no meu devaneio.
Quando, de súbito, um pombo tomou o meu caderno por uma retrete. Será que não gostou do que eu escrevi?

Linha d'água

O céu está coberto de nuvens cinzentas que filtram a luz. Gosto desta luminosidade que faz sobressair as cores vivas. O lago tem hoje a mesma cor, a mesma densidade do céu e o momento é mágico porque está um silêncio incrível, e porque tudo o que vejo está exemplarmente iluminado: o puto que conduz o pai pela mão, o ciclista que chama o cão que se banha no lago, a menina que fuma indiferente a isto tudo ali ao fundo.
Há dias em que apetece bater palmas a tudo o que se vê.
Penso: «Cada vez que tiramos uma fotografia interrogamos o mundo. Mas uma fotografia não é resposta para nada. Por isso, continuamos.»
Na verdade há mil razões para querermos tirar fotografias e todas são válidas. Mas o mais importante não está na razão por que se tiram fotografias. A verdade da fotografia está na relação que tens com o mundo. A razão pela qual tiras fotografias e o modo como o fazes, definem-te como ser humano. No meu caso, pelo menos aos meus próprios olhos, tirar fotos não é nem um simples hobby, e muito menos um ofício, mas uma maneira de estar na vida. Nem mais nem menos. É como ser poeta, jardineiro ou filósofo.
Dito isto, tenho que acrescentar, porque acabo de o descobrir: «Uma boa caneta é tão importante como uma boa companhia».

Pura realidade

Uma rapariga passa por mim, agarrada ao telemóvel. Ouço-a dizer: «Perder a memória é como perder o pé.» Terei ouvido bem?

Lisboa hoje


David Boratav (escritor turco que vive em Paris): «C’est en changeant de cadre, qu’on cadre mieux».

Lisboa hoje

Lisboa hoje


A fotografia só tem um tema: a descoberta do mundo.

Paragem


Nem queria acreditar quando deparei com esta paragem de autocarro, na Golegã. É linda!

Treblinka em Lisboa


Digam lá que a ilusão não é perfeita?
Acabei há pouco de ver o tão aguardado final de Lost (Perdidos). Afinal, as teorias mais simplistas tinham razão: as personagens já estavam todas mortas. Ficámos a saber que em Hollywood até a morte tem direito a happy end: no fim, juntas-te com a pessoa amada, com os amigos e descobres que os maus não eram assim tão ruins e que a tua vida afinal valeu a pena. Os criadores de Lost não têm dúvidas: morrer é tão natural e estimulante como viver. Na sua visão, na morte temos direito aos nossos filmes pessoais, cada um pode viver os seus sonhos, prosseguir as suas aventuras. Ou seja, para os argumentistas norte-americanos, até a morte é uma fábrica de sonhos. Uma ocasião infinita de multiplicar o entretenimento. Sendo que a moral é: faças o que faças, escolhas o que escolheres, ninguém foge ao seu destino. Todos morremos, é apenas uma questão de tempo. 6 anos «perdidos»?

terça-feira, 1 de junho de 2010

Aforismo

Tudo desaparece. Até o que não existe..

Constatação

Quase tudo é mentira
Nesta ficção a que chamamos tempo.
Nem a nossa vida é definitiva.

Constatação

Quanto tempo perdido
Para chegar a estas palavras dolorosas:
O meu corpo já não é solução para nada.

Da solidão

Nada nos envelhece mais do que a solidão.

Da poesia

Ofício melancólico, este
De querer apagar fogos
Onde eles não existem.

Arquivo do blogue