terça-feira, 24 de março de 2009

Ficção rápida

Ele tem 90 anos. Ela anda lá perto.

ELE : Estou cansado de viver, de acordar todos os dias, de fazer a barba e tomar o pequeno-almoço. Todos os dias acordo com um grande ardor nos olhos e no ventre. Não saio de casa e é como se andasse perdido. Estava na hora de haver um milagre: de acordar uma manhã e ter 20 anos. E perceber que a minha velhice não passara de um pesadelo. Poderia então empreender a tal viagem, sempre adiada, ao paraíso.

ELA : O sabor desta maçã, esta sombra que entra pela casa e o canto do passaro no pátio... tudo isto me dá o gosto de viver. Esta flor que respiro, este pão que fiz com estas mãos... Amar isto é amar-me. E amar-te.

ELE : Quando falas assim, no meu coração acende-se uma luz. Tudo o que dizes é como seiva para o meu tronco ressequido. Contigo sinto-me seguro e leve. Calmo e denso. Com raízes profundas e horizontes largos. Amo-te mais do que a mim mesmo.

ELA : Bom-dia meu amor.

ELE : Respiro agora ao ritmo do teu pensamento. Vejo o caminho para te merecer. Aqui, nesta pequena casa de pele e osso, volto a sentir uma sede feliz de vida. Bom-dia minha querida!

Beijam-se e o pano cai.

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