segunda-feira, 20 de abril de 2009

Aprender a ver



Quando somos fotógrafos, artistas plásticos ou simplesmente pessoas interessadas no mundo, estamos constantemente a aprender a ver. É de resto por isso que (alguns de nós) visitamos exposições. Pois bem, na Culturgest estão, neste momento, duas propostas interessantíssimas e congratulo-me por ter tido ontem a ideia de as ir visitar. A primeira que percorri chama-se «A Analogia do Olho» e é de um tal JCJ Vanderheyden, um artista holandês de que nunca tinha ouvido falar. Ao ver as primeiras telas lembrei-me de Mondrian, mas logo vi outras obras que me deram a certeza de estar perante um universo muito próprio e uma linguagem original onde a pintura e a fotografia dialogam num jogo de complementaridade entusiasmante. Obcecado como sou por nuvens e aviões, simpatizei de imediato com as suas fotografias do céu, das nuvens e da neve no alto das montanhas, tiradas a partir de aviões, sempre com a preocupação de mostrar a janela através da qual realizou as imagens. A essas fotografias, que por vezes inspiram telas pintadas, ele contrapõe outros temas recorrentes como quadriculas deformadas e espelhos de toda a sorte onde a sua obra se reflete e multiplica. Para além das fotografias em formatos vários e das pinturas onde as habituais telas quadradas e retangulares dão lugar a formas oblongas, distorcidas, o artista utiliza também painéis e cabinas compostas por várias reproduções de imagens suas e de outros artistas num jogo de referências e analogias, lúdicas e provocatórias. Muito mais haveria a dizer mais sobre esta exposição aliciante, que é um desafio permanente à nossa inteligência, memória e imaginação. Como diz o programinha, distribuído gratuitamente à entrada, «Vanderheyden está interessado na questão de como a consciência humana imagina o tempo e o espaço, e que analogias visuais desse processo são concebíveis». Diz também, com toda a razão, que ele é um artista importante que merece maior reconhecimento internacional.


Pelo menos tão estimulante como esta é a outra exposição patente na Culturgest, também ela até 10 de Maio. Trata-se de «Trabalho de Campo» uma coleção de fotografias do alemão Jochen Lempert. São fotos a preto e branco, em diversos formatos, penduradas na parede sem necessidade de molduras ou passe-partout que, à primeira vista, dão ideia de estarem mal impressas. Na verdade, há aqui um trabalho meticuloso de laboratório que acentua o carácter único das suas propostas. A surpresa começa logo na primeira sala com uma série de fotografias que «escondem» diversos animais ao nosso olhar: um gato por detrás de umas persianas, uma tartaruga sob a água ou um cisne sem cabeça, por exemplo. Obcecado por animais, e particularmente por aves, Lempert interessa-se também por vegetais, microrganismos e fenómenos físicos e atmosféricos, colecionando séries onde procura (por vezes, no limiar da abstração) relações entre estruturas, texturas e formas. À medida que vamos percorrendo as salas, o autor consegue fazer-nos sentir que estamos perante uma obra exigente e rigorosa, transmitindo-nos o seu fascínio por coisas tão simples como a beleza aleatória de um voo de aves, das ondas do mar ou das chamas de uma árvore em fogo. Quando saí da exposição, sentia que tinha adquirido um novo olhar sobre algumas coisas deste mundo. E senti-me grato.

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